Um projeto de Educação Consciente: Como nos tratamos?

domingo, junho 11, 2017

Como nos tratamos? Esta foi a “provocação” que serviu de mote para o projeto que decorreu na nossa sala ao longo de duas semanas. Eu e os meus dezoito alunos, partindo da experiência do arroz de Massaru Emoto, colocámos dentro de três chávenas arroz cru e água de forma a que o arroz ficasse coberto (mais ou menos 2 cm acima do arroz). Depois, fizemos três etiquetas para identificarmos as chávenas. Em cada uma delas o arroz seria tratado de três formas distintas: bem, mal e com indiferença. Fizemos também um diário onde todos os dias registámos o que ia acontecendo. Eu participei em todos os momentos.


No primeiro dia, antes de iniciarmos a experiência, refletimos como nos andávamos maioritariamente a tratar. Das dezoito crianças, doze disseram que maioritariamente tratavam bem os outros, cinco disseram que tratavam mal e uma disse que umas vezes tratava bem e que outras vezes tratava mal. Após esta reflexão iniciámos a experiência. As chávenas passaram por todos e cada um verbalizou insultos ou palavras afetuosas, consoante era a chávena que iríamos tratar bem ou mal. Houve crianças que perguntaram se a verbalização teria que ser feita em voz alta. Disse que sim, pois a principal forma como comunicamos também é verbal e audível, por isso todos concordaram. Decidimos também que poderíamos fazer gestos (enviar beijinhos...)  ou ações (cantar, gritar para o arroz).
No segundo dia, as chávenas voltaram a passar por todos e constatámos que o tratar mal saía de uma forma mais natural e que quando se dirigiam ao arroz que tinha que ser bem tratado, as crianças pensavam mais e mostravam alguma dificuldade em se referirem a coisas positivas sem serem centradas em bens materiais. Por exemplo, algumas diziam ao arroz que era para tratar bem: “Tens uma camisola linda, gosto dos teus sapatos…” Pedi que se centrassem mais em qualidades, e demonstrassem mais sentimentos e emoções e houve mesmo uma criança que expressou: “Isto é difícil!”
No terceiro dia, antes de começarmos a nossa nova rotina do arroz, falámos como é que as crianças se sentiam melhor no seu dia a dia: se era quando os outros as tratavam bem ou quando as tratavam mal. Dezasseis disseram que se sentiam melhor quando as tratavam bem e duas que era quando as tratavam mal. Senti que estas duas crianças quiseram ser diferentes, e por isso pedi-lhes que fechassem os olhos, colocassem as mãos no seu coração e dissessem, para si, se dariam a mesma resposta; ambas disseram que não. Prosseguimos com as verbalizações e notámos que as que eram dirigidas à chávena onde estava o arroz que tratávamos mal eram expressas de forma muito intensa e até libertadora, enquanto que para a chávena em que o arroz deveria ser bem tratado continuava a existir uma certa vergonha na verbalização e esta era também mais demorada.
No quarto dia, surgiram os primeiros resultados:
ü  O arroz da chávena em que não fazíamos nada, ou seja, tratávamos com indiferença, foi o primeiro a ficar com bolor;
ü O arroz que tratávamos bem surgiu-lhe uma pinta preta no meio;
ü  O arroz que tratávamos mal estava totalmente límpido.

As crianças revelavam-se bastante entusiasmadas e ao mesmo tempo surpreendidas com estes resultados e surgiram algumas partilhas: 
ü  Como nos sentiríamos se não nos ligassem? Se calhar iríamos sentir-nos tristes, zangados, sem amigos e sós, por isso é que o arroz em que não fizemos nada estava com bolor.
ü  Provavelmente não estamos a tratar a chávena do bem, suficientemente bem. E lembrámo-nos de algumas verbalizações que tinham sido feitas: “Tens uma cabeça muito grande, mas eu gosto de ti à mesma. Tens um cheiro esquisito.”  Dramatizámos estas duas situações na realidade e rapidamente se percebeu que estes dois exemplos não eram tratar bem. A criança a quem foi dita a primeira frase chegou mesmo a afirmar que apenas se centrou que tinha uma cabeça muito grande e que a parte do gosto de ti, já não tinha valorizado.
ü  O fato de se poder expressar raiva e gritar na sala, trazia algum bem-estar.
Durante o fim de semana não fizemos nada e na segunda-feira quando regressámos existiam grandes alterações: o arroz que tratávamos mal estava com uma camada geral de bolor e o que tratávamos bem permanecia apenas com o ponto preto. Na chávena da indiferença os bolores espalhavam-se pelo arroz, existindo agora pequenos bolores distribuídos pela chávena.



Neste dia, percebi que esta prática já fazia parte da rotina de sala de aula e tudo fluía de uma forma muito mais natural em ambos os tratamentos que se davam ao arroz. Quando a chávena do bem passava começaram a surgir crianças que cantavam músicas e diziam que o arroz era maravilhoso, enviavam-lhe beijinhos e abraçavam a chávena… Na chávena em que estava o arroz que tratavam mal, o fator riso e sensação de bem-estar observada nas verbalizações iniciais parecia ter desaparecido, surgiam expressões faciais de irritação, de desprezo e um menino criou uma música tipo rock onde gritava: “Tu não és maravilhoso!”
E assim se tinha passado uma semana. Na chávena que tratávamos mal o arroz estava a ficar totalmente preto e na chávena que tratávamos bem, o arroz continuava apenas com a pinta preta inicial.



Conversámos um bocadinho sobre o que estaria a acontecer ao arroz e estas foram as palavras das crianças:
ü A “força” com que nós tratamos já está a fazer efeito;
ü Será que quando nos tratam mal também ficamos pretos por dentro como o arroz que estamos a maltratar?
ü O arroz que estamos a tratar bem está mais vivo, mais amarelo por dentro, porque o amarelo é a cor da felicidade, o amarelo mostra os sóis da alegria e o arroz deve estar a sentir o nosso carinho.

Continuámos a experiência. Todos os dias fazíamos as verbalizações e depois falávamos um bocadinho. Percebemos que o arroz que era maltratado estava mesmo muito preto e que o arroz que tratávamos bem permanecia apenas com a pinta preta inicial e que esta não se alargava. Então, uma das crianças disse que o arroz que era bem tratado talvez tivesse ganho uma camada protetora. No décimo dia da experiência e último dessa semana, resolvemos não fazer verbalizações, e optámos por colocar o arroz que tratávamos mal, um bocadinho no bengaleiro às escuras e o arroz que tratávamos bem junto das colunas com uma música bem animada e escolhida pelos alunos: Despacito.
Quando regressámos do fim de semana, já não existiam dúvidas relativamente à identificação das chávenas.
ü  O bolor do arroz tratado com indiferença estava a estender-se;
ü  O arroz que era maltratado estava totalmente negro;
ü  O arroz que tratávamos bem continuava amarelo e reluzente, pois segundo os alunos, tinha a sua camada protetora.
No dia seguinte, falámos sobre emoções e sobre a importância desta camada protetora que tinha surgido no arroz que tratávamos bem. As crianças disseram que iam existir alturas em que poderiam ser maltratadas mas que, se tivessem essa camada protetora, o mal não entraria e que a camada protetora só se desenvolveria se tivessem AMOR. Foi um momento muito importante para todos, esta conclusão.
Tinham passado duas semanas e apesar da experiência se poder realizar durante um mês, sentimos que os resultados eram muito evidentes e que não era necessário continuarmos.

Estas foram as conclusões a que chegámos e que todos registaram no caderno:
ü Tratar com indiferença não é bom pois foi o primeiro arroz a ficar com bolor;
ü Ao ser-se tratado com indiferença também se experienciam emoções tais como: tristeza, solidão, raiva, zanga… Pode até surgir preocupação e interrogarmo-nos se existe alguma coisa errada connosco para não nos ligarem;
ü O arroz que tratámos mal ficou totalmente preto e cheio de bolor. Quando tratamos mal os outros sentimo-nos com raiva, sem paciência, tensos e os outros também sentem e podem até ficar assustados;
ü O arroz que tratámos bem ficou com uma camada protetora, que parece que dá ao arroz poderes para enfrentar o mal, pois a pinta preta inicial nunca se espalhou. Quando tratamos bem os outros sentimo-nos alegres, felizes, com companhia e os outros também;
ü  Percebemos que a forma como nos tratam e como nós tratamos os outros têm efeitos em nós.

No final, partilhei com eles as fotografias da mesma experiência que eu tinha realizado com a Di em 2014 e o vídeo de Massaru Emoto, para compararmos resultados e percebermos que os mesmos já tinham sido comprovados.

Quando realizei a experiência com a Di, já tinha achado os resultados extraordinários e na altura senti que ela tinha ficado muito mais cuidadosa na forma como se relacionava com os outros. Durante esta semana, a Di esteve sempre muito dedicada e não se esqueceu nenhum dia das suas chávenas. Os resultados foram muito rápidos e a Di tinha as mais variadas ideias para expressar as suas emoções. Desde tocar piano para o arroz que estava a tratar bem, levá-lo a fazer os trabalhos de casa com ela e a andar com ele pela casa a dançar, a fechar num quarto escuro e a pôr de castigo o arroz que era para tratar mal, tudo acontecia. Gostei muito de vê-la expressar os seus sentimentos e tive a noção de como ela sabia o que era tratar bem e mal. Ao fim de uma semana já tínhamos resultados bastante evidentes e terminámos a experiência.
  Deixo a sugestão de fazerem com os vossos filhos em casa, pois esta experiência é muito elucidativa e demonstra de uma forma simples e concreta que a forma como nos tratamos é determinante. Acredito que ao transmitirmos esta mensagem aos nossos filhos, desde pequeninos, eles se tornarão muito mais conscientes no seu relacionamento com os outros, o que lhes trará repercussões bastante positivas e transformadoras no seu dia a dia. 
Esta foi a primeira vez que realizei a experiência em sala de aula e foi surpreendente e maravilhoso ver as reações das crianças às alterações que o arroz ia apresentando.
 Na primeira semana começaram logo a verificar-se mudanças na forma como interagiam umas com as outras e as alterações no relacionamento diário eram impressionantes. Tom de voz, mais pacientes e tolerantes umas com as outras enquanto grupo e saberem esperar foram as mudanças de atitude mais visíveis.
 Realizar a experiência na sala com todos os alunos, confesso que foi mais desafiante do que fazer em casa com a Di. Da minha parte, obrigou a empenho, dedicação e criatividade, dos alunos exigiu entrega e confiança para poderem expressar as suas emoções, e determinação para que fizéssemos todos os dias. Se iniciávamos a aula e não íamos buscar as chávenas eles lembravam-me logo desta rotina.
 Sinto que foi um projeto muito gratificante, que nos possibilitou presenciar, partilhar e crescer individual e coletivamente. A experiência teve momentos únicos que eu nunca poderia prever e que permitiram que todos nos compreendêssemos melhor, a nós e aos outros, e viabilizou a existência de tempo e espaço para que os alunos pudessem sentir e descobrir o seu verdadeiro EU em sala. Uma experiência, sem dúvida a repetir em turmas futuras e em todas as salas de aula em que a nossa intenção seja orientar e melhorar o relacionamento entre todos.

Obrigada, queridos alunos, por todos os dias crescermos juntos!

Até já.



Podemos ir à sua Escola ou à sua Empresa.
info: paisconscientescriancasfelizes@gmail.com

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